Tesouro fará aporte de R$ 100 bilhões para o BNDES
Os recursos virão de títulos públicos e também do superávit financeiro, que é resultado das despesas previstas no orçamento e que não foram gastas e também de receitas maiores do que o estimado. Segundo Mantega, 70% dos recursos colocados à disposição do Banco serão remunerados por TJLP mais 2,5% ao ano, enquanto para os 30% restantes o BNDES vai pagar ao Tesouro a taxa de captação externa do próprio Tesouro.
O ministro explicou que os recursos ficarão disponíveis no Tesouro para o BNDES, que fará saques conforme a necessidade. "Não faltará crédito. A oferta será maior que a demanda", disse ele ao reforçar que não faltarão recursos para investimentos nas áreas de petróleo, gás, energia elétrica e infraestrutura em geral.
De acordo com Mantega, o BNDES havia solicitado R$ 50 bilhões ao Tesouro para execução de um programa de R$ 116 bilhões em investimentos. "Estamos dando os R$ 50 bilhões que eles pediram e mais R$ 50 bilhões. Com isso, eles terão R$ 166 bilhões para aplicar em 2009", disse sem dar maiores detalhes.
Os R$ 100 bilhões significam, segundo ele, recursos para investimentos no Brasil a custo reduzido, abaixo do mercado, e terão como consequência a criação de empregos. "É assim que nós enfrentamos a crise econômica mundial: mantendo o nível de investimentos. Estamos assegurando recursos para as empresas continuarem investindo. Isso significa geração de empregos. Nossa preocupação explícita é com a manutenção e geração de empregos", disse ao destacar que há uma demanda significativa por crédito para investimentos e que mesmo diante da crise não houve desistências significativas nos pedidos ao BNDES.
O ministro assegurou que, com essa oferta de crédito, não haverá recessão na economia brasileira em 2009 e que o País manterá taxas de crescimento positivas. Segundo Mantega, o governo tem instrumentos para garantir a expansão da economia.
Impacto fiscal
Mantega afirmou que o repasse de R$ 100 bilhões ao BNDES não terá impacto fiscal para o governo, uma vez que se trata de uma operação eminentemente financeira. "O impacto fiscal é zero, pois é um empréstimo financeiro. O Tesouro faz um crédito (para o BNDES) e tem algo a receber", argumentou. Mantega afirmou que para a operação será necessária uma medida provisória e informou que todo o repasse para o BNDES será feito em reais, embora uma parte (30%) será remunerada com taxa de juros em dólar.
Mantega informou que a medida provisória autorizando a liberação será publicada nesta sexta-feira (23/01) no Diário Oficial da União. Segundo ele, a engenharia financeira da operação levará em conta a liberação de títulos para o BNDES e parte do superávit financeiro das contas do governo federal. Ele disse que o volume de cada parte (títulos ou superávit) ainda não está definido.
O governo aposta na combinação de juros menores e mais dinheiro para o BNDES para tentar animar as expectativas de consumidores e empresários. O "combustível" no motor do BNDES vai assegurar o crédito mais barato para as empresas manterem seus investimentos.
O dinheiro adicional também vai permitir o financiamento do plano de investimentos da Petrobrás para os próximos anos, que será fechado em reunião do conselho de administração da estatal, marcada para esta sexta-feira. A estratégia é que o BNDES possa garantir os investimentos da petrolífera, que vem tendo dificuldades para captar recursos no exterior com taxas mais baratas. Estima-se que o financiamento à estatal possa chegar a R$ 20 bilhões. Com o financiamento do BNDES, a Petrobrás ganha margem de manobra nas negociações com os bancos.
Durante o anúncio das medias, Mantega avaliou que os investimentos da Petrobrás "são mais importantes do que o de qualquer outra empresa". Segundo ele, é importante que todo o plano estratégico de investimentos da estatal seja concretizado. Ele lembrou que a estatal é a maior empresa brasileira e movimenta uma cadeia produtiva longa na economia do País. "Ela mobiliza a indústria nacional", disse. Segundo o ministro, a preocupação do Estado é garantir crédito suficiente para viabilizar os investimentos.
Mantega não desmentiu nem confirmou informação de que a Petrobrás poderá receber R$ 20 bilhões do BNDES. "Não há volume definido para a Petrobrás. Estamos garantindo toda a necessidade de crédito da empresa", acrescentou.
Os recursos também vão garantir o financiamento dos projetos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) realizados por empresas privadas.
Indústria comemora reforço do BNDES
O aporte de R$ 100 bilhões foi bem recebido pelas entidades que representam a indústria. A avaliação dos industriais é de que o reforço de caixa dará dinamismo à economia em um momento de crise.
Paulo Skaf, presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) e integrante do conselho de administração do BNDES, considerou "boa notícia" o anúncio do ministro da Fazenda. Mas disse que todo projeto que chega ao banco estatal tem por objetivo gerar emprego e ser lucrativo desde o momento que sai do papel. "Não se trata de salvar empresas. O banco está lá para emprestar e a empresa que toma recursos do BNDES fica devendo, paga juros. É dinheiro empregado em projetos de fomento, que visam crescimento, empregos, lucro".
O fato de os recursos suplementares serem para infraestrutura, avalia Skaf, deve ser comemorado. "O Brasil precisa arrumar sua infraestrutura, porque as crises são passageiras e não podemos ter limitações quando o crescimento for retomado", disse.
O presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Armando Monteiro Neto, considerou "muito importante" a decisão do governo de colocar à disposição mais R$ 100 bilhões para o BNDES. Ele interpreta a medida como uma tentativa do governo de substituir fontes externas de financiamento que "desapareceram" com a crise. "A iniciativa deve contribuir para melhorar o quadro em relação ao desemprego".
Na avaliação de Humberto Barbato, presidente da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee), o pacote vai ajudar tanto as empresas que atuam em infraestrutura como também a indústria de bens de consumo. "O pacote é positivo, pois vai irrigar com crédito o setor de infraestrutura e deve restaurar a confiança do consumidor, na medida em que pode evitar novas demissões", diz Barbato. Ele diz que 48% das empresas do setor perderam encomendas em razão da crise.
Em entrevista, Paulo Godoy, presidente da Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib), afirmou que a ação do Ministério da Fazenda "mostra a opção do governo pela infraestrutura como um agente anticíclíco para aliviar a retração econômica de alguns setores da economia brasileira, além de ser um sinal de que as obras do PAC serão mantidas".
Para ele, com o anúncio do ministério, deverá acontecer um maior número de concessões, por exemplo, em setores como o de energia. "Até agora, um dos problemas era a falta de funding e isso acaba de ser solucionado. Além disso, o fato de parte dos recursos ser voltado para viabilizar o plano de investimentos da Petrobrás diminui a pressão sobre o crédito interno".
Governo deve estatizar crédito , diz Belluzzo
Luiz Gonzaga Belluzzo, ex-secretário de Política Econômica e professor da Universidade de Campinas, defende a "temporária estatização da concessão de crédito" no País. Para ele, a decisão do governo de deixar disponível ao BNDES R$ 100 bilhões é bastante correta e precisa ser amplificada. "Os bancos no Brasil não estão realizando empréstimos às empresas e consumidores. Na crise, revela-se o caráter coletivista do sistema de crédito nacional".
Para Belluzzo, o governo precisa adotar uma atitude mais positiva em relação ao crédito, como "emprestar diretamente às empresas", pois as instituições financeiras comerciais ficaram conservadoras demais num período de retração econômica e o risco é levar o País à recessão. Na avaliação dele, se os bancos não querem conceder financiamentos, o governo deveria fazê-lo diretamente com recursos do Tesouro Nacional. "Esse movimento está ocorrendo nos EUA e na Inglaterra, onde os respectivos governos estão injetando volumes expressivos de capitais para que o sistema financeiro e empresas voltem a trabalhar normalmente", comentou. "O Estado não pode deixar a economia parar se os bancos comerciais decidiram não conceder empréstimos."
De acordo com Belluzzo, o governo está correto em agir vigorosamente com medidas de cunho fiscal e monetário porque o País passa por uma profunda queda do nível de atividade. Ele ressaltou que tal desaceleração é perigosa e pode deprimir o consumo de forma crônica e ampliar a freada que o País já observou nos últimos três meses. E sem o retorno do fluxo pleno do crédito, destacou Belluzzo, a economia tende a declinar de forma ainda mais acentuada no curto prazo.
Nesse contexto, Belluzzo defende também que o governo adote uma estratégia mais ampla para sustentar os investimentos de longo prazo, como redução do superávit primário. "Uma diminuição do superávit primário na atual conjuntura é necessária para que tais recursos sejam destinados especialmente à ampliação da Formação Bruta de Capital Fixo, o que é essencial para proteger a produção e os empregos do País", destacou.
O economista-chefe da LCA, Braulio Borges, estima que tal poupança do Orçamento atingiu 4,2% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2008. Para cada queda de 1 ponto porcentual do superávit primário o País cresce 0,4 ponto porcentual. "O superávit primário precisa ser utilizado de forma anticíclica. E agora é o momento adequado para ser aplicado de forma expressiva para estimular a economia", aponta Belluzzo.