Estratégia Nacional de CT&I deverá ter avaliação de qualidade a partir de agosto
A Estratégia Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação (Encti), lançada em maio, terá prosseguimento a partir desse mês nos planos setoriais e uma etapa importante está prevista para começar em agosto: a avaliação.
A Estratégia Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação (Encti), lançada em maio, terá prosseguimento a partir desse mês nos planos setoriais e uma etapa importante está prevista para começar em agosto: a avaliação. É o que comentou o Secretário de Políticas e Programas de Pesquisa e Desenvolvimento (Seped) do Ministério de Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC), Jailson Bittencourt de Andrade, em mesa redonda realizada ontem, na 68ª Reunião Anual da SBPC. O debate sobre o Encti contou com a participação da presidente do Conselho Nacional de Secretários Estaduais para Assuntos de CT&I (Consecti), Francilene Garcia, com a diretora de inovação da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Gianna Sagazio e o presidente da Academia Brasileira de Ciências (ABC), Luiz Davidovich. A mesa foi coordenada pela presidente da SBPC, Helena Nader.
“A partir das estratégias, vamos caminhar com os planos nacionais de CT&I e esses planos setoriais é onde essas estratégias são detalhadas. E esperamos avançar a partir de agosto com uma avaliação, qualitativa, que possa ser um objeto de gestão, para que possamos fazer correções de rumos”, disse Bittencourt.
O secretário, que é também conselheiro da SBPC, conta que um novo atrativo dessa estratégia é que ela assume que as ações precisam ter, pelo menos, três dimensões: social, científica e tecnológica e a dimensão econômica. “Então, todas essas ações devem levar em conta a qualidade de vida da população, o reflexo econômico e tudo isso baseado em CT&I”, diz.
A Encti 2016-2019 tem o título Ciência, Tecnologia e Inovação para o Desenvolvimento Nacional e, conforme conta Bittencourt, esse desenvolvimento se dá por meio de ações que usam intensivamente tecnologia e a inovação para mitigar as desigualdades regionais e sociais do País. “Esse desenvolvimento envolve um processo dinâmico de inovação e ele tem dois pilares que atravessam todo o documento: educação e pesquisa básica”, complementa. Ele conta ainda que o documento vem de um histórico recente da legislação, desde a luta para colocar a palavra inovação na Constituição, em 1985, passando pelo Marco Legal da Biodiversidade – “apesar de todos nós termos concordado que a lei que foi sancionada não manteve o que se queria” -, até o Marco Legal da CT&I, sancionado em janeiro esse ano, com oito vetos, que ainda estão para ser discutidos.
A Encti 2016-2019 traz uma série de macrometas, que são, na prática, uma atualização das metas estabelecidas na versão anterior, de 2013. Uma delas era que o Brasil previa 700 pesquisadores por milhão de habitantes, e nessa nova estratégia prevê chegar a 2100 em 2019. Ao mesmo tempo, propõe a ampliação do dispêndio nacional do PIB – de 1,24%, que era a meta anterior, para 2%, sendo que 0,9% é a proposta da Mobilização Empresarial pela Inovação (MEI) para o dispêndio empresarial. E, ainda, define que a taxa de inovação das empresas deve passar de 35,7% para 48,6%.
“A Encti traz uma série de desafios que buscam posicionar o Brasil entre os países com maior desenvolvimento em CT&I, aprimorar as condições institucionais para elevar a produtividade a partir da inovação, reduzir as assimetrias regionais na produção e no acesso à CT&I, fortalecer as bases para a promoção do desenvolvimento nacional e, por fim, desenvolver soluções inovadoras para inclusão produtiva e social”, explica o secretário do Seped.
Entre as áreas que a Estratégia destaca, estão a água, a segurança alimentar e energética, o clima, a saúde, os biomas e a bioeconomia, a economia na sociedade digital, tecnologias convergentes, aeroespaciais, o sistema nuclear e, também, ciência e tecnologias sociais. Esta última foi incluída por sugestão da SBPC, conforme ressaltou ele.
Participação social
Francilene Garcia, do Consecti, aprovou a inserção da avaliação na Encti, e comentou que se essa medida tivesse sido adotada na versão anterior, estaríamos melhores preparados agora. “Chegamos a 2016 com uma estratégia de 2012-2015 pobremente avaliada para que pudéssemos chegar aqui mais preparados e para que pudéssemos aproveitar melhor o novo ambiente legal”, disse.
A presidente do Consecti criticou a descontinuidade das políticas públicas no Brasil, apesar dos avanços conquistados nas últimas três décadas, e disse que é importante manter os esforços para manter os investimentos na área. “A descontinuidade na política federal, na medida em que decide pela fusão de um ministério, tem trazido repercussões negativas em alguns estados da federação em um momento no qual todos estão em crise. Uma das primeiras áreas cortadas é exatamente a parte de C&T.
Garcia fez um histórico das discussões sobre políticas de C&T no País, sobre como planos de ação chegaram a uma estratégia nacional, desde a 1ª Conferência Nacional de Ciência e Tecnologia, quando as discussões ainda eram sobre bolsas de fomento básico, e algumas sobre estratégias para o País, mas ainda muito distantes do plano que temos hoje. A palavra inovação, conta ela, foi integrada com a 2ª CNCTC, em 2001. E a primeira ação para um Plano de Ação em CT&I foi em 2007, “mas ainda muito voltada para inovação nas empresas”. A necessidade de transformar CT&I em política de Estado retornou clara em 2010, bem como a questão da sustentabilidade, que colaborou para o novo Marco Legal da CT&I.
“Esse novo ambiente legal chega num momento de muita crise, muito contingenciamento de recursos, e, obviamente, a ausência de uma trajetória de avaliação que a gente poderia ter”, comenta.
Contribuição das empresas
A Mobilização Empresarial pela Inovação (MEI) organizou uma proposta do setor produtivo para a Encti. De acordo com Gianna Sagazio, diretora de inovação da organização, a proposta foi construída a convite de Bittencourt. “A MEI analisou as propostas da primeira minuta da Encti, e fez uma comparação com a agenda da instituição de 2016, construída com os líderes empresariais. Desse estudo, foi feito um resumo das ações que a MEI acredita ser necessário para alcançar inovação – em termos de leis, propriedade industrial, recursos humanos para inovação e financiamento”, contou.
Foram propostos 18 objetivos e 33 indicadores. A modernização do arcabouço legal é considerada a base para essa estratégia, bem como a consolidação da infraestrutura e do pessoal, o fortalecimento do setor produtivo nacional, domínio de temas tecnológicos relevantes e desenvolvimento da sociedade. “A contribuição da MEI para a Encti foi através da constituição de uma visão de futuro, de missão, indicadores e metas plurianuais”, explica ela, sobre a proposta seguir uma linha executiva.
Uma das principais atividades da MEI é contribuir para a formulação e o aprimoramento de políticas, com propostas no ambiente político, regulatório, educação e pesquisa, conforme conta Sagazio. “A organização entende que ciência e tecnologia são fundamentais para elevar a competitividade do País. A estratégia nacional permite alinhar esforços para resultados concretos e o amadurecimento do sistema nacional de CT&I”, conclui.
Consenso
Para o presidente da ABC, Luiz Davidovich, os itens colocados na Encti 2016-19 são praticamente consensuais. “Evidentemente, são tópicos que têm que ser abordados numa política de desenvolvimento científico e tecnológico nacional”, disse, enfatizando que é preciso pensar nos obstáculos à realização desses objetivos: “Precisamos enfrentar os problemas que dificultam a realização dessas estratégias”.
Segundo ele, ciência e tecnologia ainda não é percebida como prioridade pelas autoridades, e citou o documento “Uma Ponte para o Futuro”, no qual se baseiam as propostas do governo interino, onde a palavra ciência não aparece uma só vez. “As altas autoridades precisam colocar na cabeça a importância da C&T”, disse, destacando exemplos dos Estados Unidos e da China, onde as políticas de desenvolvimento social e econômico são fortemente baseadas em CT&I.
Davidovich criticou a aplicação dos Fundos Setoriais, cuja arrecadação cresceu nos últimos anos, mas a aplicação em CT&I começou a cair a partir de 2010. “Precisamos acabar com o contingenciamento das verbas dos Fundos Setoriais”.
O cientista enumerou uma série de grandes projetos científicos nacionais que estão parados por falta de verba, como o Reator Multipropósito Brasileiro (RMB), o projeto Sirius de luz sincrotron, e os Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia (INCTs). “Esses cortes de verbas demonstram as dificuldades que teremos para realizar as metas da Encti. Nós temos que pensar como chegaremos lá”.
A presidente da SBPC, Helena Nader, ao concluir a sessão, também enfatizou a necessidade de pressionar o governo para que essa estratégia se realize da forma esperada, e não acabe em um imbróglio como a Lei da Biodiversidade e o Marco Legal da CT&I. Este último teve oito vetos em dispositivos considerados estratégicos para o avanço do desenvolvimento da ciência, tecnologia e inovação do Brasil. Ainda segundo ela, a capacidade de avaliação é uma questão importante, que precisa ser realizada.
“A Encti não pode ser mais um papel na prateleira. Temos que lutar por isso. Todos queremos um Brasil melhor”, finalizou.