INPI começa a operar como Autoridade de Busca Internacional
As ISAs fazem o Exame Preliminar de Patentes (Ipea, na sigla em inglês), cujo objetivo é verificar se a invenção a ser protegida atende aos três requisitos da patenteabilidade – novidade, atividade inventiva e aplicabilidade industrial -, e também a busca internacional, que tem como finalidade determinar o estado da técnica relacionado com o objeto do pedido de patente. O exame preliminar é opcional; a busca, por outro lado, oferece um relatório que permite ao requerente decidir se deve ou não continuar com o processo de depósito da patente nos países selecionados. O INPI, agora, será uma das agências autorizadas a realizar esses procedimentos.
O reconhecimento do INPI como ISA beneficia o Brasil, pois reduz o custo inicial do processo de patenteamento para empresas, centros de pesquisa e inventores brasileiros que queiram proteger seus conhecimentos e tecnologias pelo PCT. “Se sou brasileiro e quero estender uma patente para os Estados Unidos, poderei depositar meu pedido em português; o exame será feito por examinadores brasileiros e o relatório virá para mim em português”, explica Clóvis Silveira, presidente da Associação Paulista de Propriedade Intelectual (Aspi) e sócio-diretor do escritório C&S InterPatents, de São Paulo.
A efetivação do INPI como ISA levou um ano e nove meses. O reconhecimento ocorreu em 27 de setembro de 2007, em Genebra, na Suíça, durante a Assembleia-Geral do PCT. Na ocasião, o Brasil tornou-se o 14º país a desempenhar a função – o primeiro da América Latina. A Índia ganhou o mesmo status. Hoje, 15 países são reconhecidos como ISA. Na mesma assembleia foi aprovado o uso do português como idioma para publicação de pedidos de patentes feitos no âmbito do tratado. O presidente do INPI, Jorge Ávila, disse na época que o instituto começaria a operar como ISA em março de 2008.
Examinadores capacitados e backlog
O INPI cobrará R$ 1.530,00 para receber depósitos via PCT, conta Luiz Otávio Beaklini, assessor da presidência do instituto. Segundo ele, há pequenos detalhes ainda em fechamento com a OMPI, relacionados à atualização do PCT Easy, o software que prepara os pedidos. “Fazer do INPI uma ISA foi um sonho meu concretizado nesta gestão (de Jorge Ávila). É um grande reconhecimento para o INPI e o Brasil, porque é preciso ter capacitação técnica, bom número de examinadores capacitados para fazer a busca internacional, fluência em inglês”, afirma o assessor, que ocupou a presidência do INPI entre 2003 e 2004.
Dos 250 examinadores de patentes do INPI, perto de 100 já estão capacitados para fazer exame e busca internacional nos moldes que a OMPI exige para uma ISA. São especialistas de várias áreas (como física, biotecnologia, química e biologia, entre outras), com mestrado e doutorado. Dos capacitados, um terço são doutores. Segundo Beaklini, há um grupo “razoavelmente grande” de examinadores fluentes em espanhol. Apesar disso, em um primeiro momento, o INPI vai trabalhar com tradutores e revisores para auxiliar os examinadores no processo de busca internacional.
Beaklini conta que há dois grupos de trabalho encarregados de cuidar das adaptações necessárias para a realização do exame e da busca internacional. Um cuidou inclusive da tradução dos formulários internos para o português, algo que seria feito pela OMPI, mas que o INPI preferiu antecipar. O outro está trabalhando em qualidade, estudando as normas da OMPI para ISAs e aferindo a aderência do INPI a elas.
O ex-presidente garante que o fato de o instituto ter se tornado ISA não prejudicará o esforço para redução do backlog – o estoque de pedidos de patentes ainda não avaliados. Ele acrescenta que o INPI será a única ISA na América Latina e que a meta é alcançar um padrão de qualidade tão elevado nos exames que atraia depositantes de outros países, além dos brasileiros. “É uma confiança que precisa ser conquistada, e vamos mostrar, com o tempo, que somos capazes”, assegura.
Como funciona o PCT
O tratado foi assinado em 19 de junho de 1970. Funciona assim: empresas, centros de pesquisa ou inventores independentes entram com seu pedido junto ao International Bureau (IB), órgão da OMPI que centraliza o recebimento dos pedidos de patentes do PCT vindos de todo o mundo. Uma vez feito o depósito, o requerente tem até 36 meses para dizer em que países vai apresentá-lo. Ele assegura a prioridade em todos os países signatários do PCT e ganha tempo para preparar o pedido, fazendo, por exemplo, a tradução para a língua do país de interesse. Se uma empresa japonesa depositar um pedido de patente pelo PCT em julho de 2009 e outra empresa, da Alemanha, requerer proteção para tecnologia semelhante em abril de 2010, este segundo pedido será considerado inválido pelo fato de o outro ter sido depositado anteriormente. Isso é a chamada anterioridade.
Até agora, um pedido internacional de patente originário do Brasil, depositado via PCT, seguia para o IB e, dali, para ISAs em países como Estados Unidos, Japão e Áustria, entre outros. Nenhum deles aceita depósito em português. Quem requer a patente deve indicar a ISA de sua preferência. “No meu escritório, costumamos indicar a ISA da Áustria, convidativa pelos preços melhores. Nesse caso, o pedido, o exame e a resposta são feitos em inglês”, conta Silveira. Agora, o pedido poderá ser apresentado em português, bastando para isso escolher o INPI como ISA responsável pela busca. O pedido vai para o International Bureau, que então o devolve ao Brasil. Depois de feita a busca inicial, o INPI enviará um relatório em português para o requerente da patente.
Uma dúvida
Clóvis Silveira diz ter apenas “uma interrogação” a respeito de o INPI ser uma autoridade internacional de busca: a qualidade do exame. “Acho que sempre teremos certa dificuldade com a língua. Às vezes é preciso consultar documentos não só em inglês, mas em alemão, por exemplo. Quando deposito pedido aqui no Brasil, escolho como ISA a Áustria, pois o examinador de lá é fluente em alemão e inglês”, conta.
Para ele, o sistema apresenta essa “falha intrínseca”, que é o idioma. Não há muitos examinadores fluentes em japonês fora do Japão. Daí os pedidos terem título e abstract, um pequeno texto inicial que resume o objeto da patente, em inglês. Em um pedido feito em japonês, os examinadores não fluentes na língua podem acessar o título, o abstract e as ilustrações. “Isso pode ser um pouco complexo de inferioridade, mas não sei se somos fluentes para entender sutilezas que um examinador norte-americano entende, por exemplo. Hoje, o examinador americano reclama (de pedidos feitos por brasileiros e traduzidos para o inglês), diz que o texto não está claro, devolve o pedido para arrumarmos. Até quando é um pedido para Portugal, o agente português pede uma adaptação. O pedido sempre terá esse custo”, afirma.
O sistema internacional de proteção de invenções
O sistema internacional de pedidos e registros de patentes é regido por dois tratados. Um é o PCT, que o Brasil assinou no final da década de 1970. Antes dele, havia o sistema estabelecido pela Convenção da União de Paris (CUP) em 1883 – do qual o Império do Brasil foi dos primeiros signatários. A CUP foi a primeira tentativa de organizar um sistema internacional de proteção da propriedade intelectual; continua em vigor, apesar da antiguidade e da existência do PCT.
Pela CUP, quem deposita um pedido no Brasil, o chamado pedido nacional, tem apenas 12 meses para estender a solicitação de registro de patente para outros países. Se, por exemplo, o solicitante resolver que também quer requisitar a patente nos Estados Unidos, precisa então fazer o pedido ao United States Patent and Trademark Office (USPTO), a agência norte-americana de patentes, e reivindicar a prioridade brasileira. Isso significa que o pedido será depositado nos EUA, mas a data será a do depósito no Brasil. “Pela Convenção de Paris, o depositante tem apenas 12 meses, a partir do pedido inicial, para decidir para que países vai estender o pedido, escolher os agentes em cada país selecionado e atender às necessidades da lei de patente de cada país, como, por exemplo, traduzir para a língua do país de interesse”, resume Clóvis Silveira.
No PCT, o prazo para o requerente informar em que países quer fazer o depósito é de 36 meses. A fase nacional do PCT começa quando do depósito do pedido nas agências de propriedade intelectual de cada país escolhido pelo solicitante. O pedido internacional será analisado novamente, em cada país – por exemplo, pelo USPTO, nos EUA; pelo European Patent Office (EPO), na Europa; pelo Japan Patent Office, no Japão, etc. No caso da Europa, a patente concedida pelo EPO ainda precisa ser validada junto às agências de cada um dos países do continente. O exame da patente nessa fase é mais detalhado, pois considera as leis nacionais. Há países que não permitem patenteamento de genes, por exemplo. O Brasil editou sua lei de patentes, a 9.279, em 14 de maio de 1996.
A vantagem do PCT é baixar os custos para a análise preliminar da patente. “Se esse examinador único (da ISA selecionada pelo depositante) encontrar anterioridades em uma das ISAs, vai dizer que não tem novidade naquele pedido. As fases nacionais sequer se iniciam”, afirma Silveira. “No Sistema da CUP, é necessário entrar com o pedido antes, pagar pelos depósitos em todos os países e esperar pelos relatórios de cada um deles”, acrescenta. Ou seja, o exame preliminar dá indícios mais seguros para os depositantes a respeito da originalidade da patente, diminuindo o risco de o pedido ser rejeitado nas fases nacionais, ressalta Beaklini. Agora, com o INPI promovido a ISA, acresce-se à redução o custo da tradução para o inglês, que não precisa mais ser feita. E é só essa a economia: o solicitante continua tendo de fazer o acompanhamento da análise do pedido – há solicitações de esclarecimento dos examinadores e taxas anuais a ser pagas, antes e depois da concessão da patente. Não cumpridas as exigências, o pedido é arquivado.
Inova Unicamp