Mercado de venture capital aquecido acelera captação de investidores para novo fundo em Santa Catarina
O mercado de venture capital é a bola da vez para investidores no Brasil. A redução gradual da taxa básica de juros, que estimulou a diversificação das carteiras, e o aumento no volume de aportes em startups mesmo durante a pandemia ajudam a explicar uma tendência que pode trazer um grande impacto para o mercado de tecnologia nos próximos anos.
Em 2020, o total de investimentos em venture capital (R$ 14,6 bilhões) superou pela primeira vez o volume gerado pelo private equity (R$ 9 bilhões) no país, de acordo com estudo feito pela Associação Brasileira de Private Equity e Venture Capital (ABVCAP) e a consultoria KPMG.
“Há muita liquidez no mercado e a opção pelo venture capital está na ponta da língua dos investidores”, ressalta Marina Leite, head de Relação com Investidores da Invisto, gestora de venture capital que anunciou em 2020 o Fundo Invisto com ACATE undo de R$ 100 milhões para startups B2B, em parceria com a Associação Catarinense de Tecnologia (ACATE).
O fundo ainda está em processo de captação e atração de investidores, mas nos últimos meses a procura – e o volume de capital comprometido – cresceu de maneira acelerada. “Dividimos nosso target em cotas, para captação de investidores âncora. As oportunidades para investimento já existem, temos onde direcionar esses recursos”, explica Marina. “Estamos analisando em média 8 startups por semana. Há oportunidades muito boas em áreas como educação, logística, healthtechs e ESG (Governança Social, Ambiental e Corporativa)”.
Segundo ela, o ambiente de startups está cada vez mais exigente, fruto do olhar de investidores e fundos em aspectos de governança, cap table (divisão de cotas entre os sócios) e a maturidade ao longo do desenvolvimento das empresas. “Com o grau de exigência feito aos empreendedores, a régua para investimentos subiu”, diz a especialista.
Em linhas gerais, o fundo busca startups com soluções para o mercado corporativo (B2B), com receita mensal recorrente em torno de R$ 100 mil a R$ 150 mil – especialmente na região Sul. Pelo menos duas startups devem receber aportes do fundo Invisto com ACATE em 2021, e há outras cinco em processo avançado de avaliação por parte da gestora e investidores.
Parte dos recursos do fundo serão destinados a startups lideradas por mulheres – seja no papel de CEO ou como parte do conselho da empresa.
Para a ACATE, a participação em um fundo de investimento é uma estratégia para fortalecer empresas de tecnologia em expansão, mas que não encontram no mercado um veículo de investimento que atenda esta faixa de faturamento – em geral, uma receita recorrente mensal em torno de R$ 100 mil e R$ 150 mil. Um gap que, se for minimizado, poderia fortalecer muitas startups do ecossistema local.
“Há cinco anos temos a Rede de Investidores Anjo, que auxilia no início da jornada dos empreendedores. Mas faltava um veículo voltado ao passo seguinte do negócio, um venture capital, com possibilidade de investimento maior do que os anjos mas que consigam atuar próximo dos empreendedores, ajudando-os a se tornarem executivos. Com essa jornada, amplia muito a possibilidade de nossas empresas estarem capacitadas para irem buscar recursos em fundos maiores”, argumenta Iomani Engelmann, presidente da ACATE.
Esta atuação da entidade no mercado de venture capital também completa uma jornada de capacitação e investimentos que começa desde a incubação, com o MIDITEC, até a Rede de Investidores Anjo (RIA), criada em 2016 em parceria com a Anjos do Brasil, e que já aportou recursos em diversas startups do ecossistema, como Geekhunter, Prevision, BioNexus e Cheap2Ship, que recentemente recebeu um aporte follow on da RIA.
A Rede conta com cerca de 50 investidores pessoa física que compartilham experiências e oportunidades de negócio, fazendo muitas vezes aportes em grupo, minimizando riscos e ampliando o potencial de recursos às startups.
“Muitos consideram o anjo como uma pessoa difícil de acessar, mas ele é na verdade o mais fácil para quem está começando. É quem pode ajudar bem na hora que a empresa está começando a rodar, e é um estágio muito importante no processo de captação de outros investimentos”, avalia o empreendedor e investidor anjo Fábio Ferrari, líder da RIA SC.
“O mais legal de um grupo como esse é não precisar fazer um investimento sozinho. Ele pode se cotizar com outros anjos, ou fazer coinvestimento com fundos early stage. Se o investidor é parte de uma rede como a RIA, por exemplo, ele ganha autoridade para conversar com essas gestoras e fundos, dá um lastro importante”, ressalta Fábio, que foi investidor líder, pela RIA, de uma rodada na construtech Prevision, em 2019. Naquele ano, cinco startups receberam um volume total de R$ 4,2 milhões por meio da RIA SC.
Quando não há o investimento direto, há a conexão: recentemente, a startup Quiron (Lages/SC), que desenvolve software de monitoramento para ameaças florestais, chegou à sua nova sócia por meio da Rede de Investidores Anjo da ACATE. Em março deste ano, a BossaNova Investimentos aportou um cheque de R$ 750 mil na empresa da Serra catarinense.
“A startup é uma jornada intensa e que demanda demais do empreendedor. As organizações podem e devem colaborar, desde as incubadoras até o IPO”, avalia Maria Rita Spina, diretora executiva da Anjos do Brasil. Para ela, a aproximação com o ecossistema catarinense por meio da ACATE foi muito positiva, “porque a entidade já entende a lógica local, a cultura da região, que vai desde a melhor hora de fazer um encontro de investidores, até a atração de empreendedores”.
“Ao mesmo tempo, trouxemos uma metodologia, uma experiência de seleção de startups consolidada, algo que é complexo, sofisticado. E acabamos juntando duas coisas bem poderosas para o ecossistema”, avalia.
“Quanto mais cedo a empresa estiver organizada nas questões financeiras e tributárias, tiver uma governança corporativa adequada, melhores as condições para receber recursos ao longo dessa jornada. Isso agiliza o processo, traz mais confiança ao investidor, acelerando o deal. É o que costumamos passar às startups desde que começam na incubadora”, reforça o empreendedor contábil, investidor e consultor do MIDITEC, Ismael Silva.
FALTA DE EXPOSIÇÃO AO RISCO: BARREIRA CULTURAL AO DESENVOLVIMENTO DA INOVAÇÃO
“Uma das características do brasileiro é a pouca cultura de exposição ao risco. Somos conservadores no investimento. Outra questão era a falta de segurança jurídica para o investidor, mas o marco legal das startups vem para diminuir um pouco essa incerteza”, comenta Iomani.
Mas há um terceiro ponto, mais estrutural, que é o desconhecimento de como fazer investimentos em tecnologia. “O maior gargalo com relação a capital para startups é a falta de pessoas que conhecem os veículos de investimento e que estejam aptas a atuar nesse modelo. Nesse sentido, a Rede de Investidores Anjo tem esse papel: atrair investidores interessados e evangelizar o mercado sobre outras possibilidades de negócio”, diz o presidente da ACATE.
A Invisto tem feito alguns roadshows para apresentação do novo fundo a investidores, fundos de pensão e corporates, esperando até ultrapassar a meta de captação inicialmente prevista para o fundo. “Entramos logo depois do anjo, da aceleradora. É nesse nicho que faltam cheques. Existe carência e não faltam oportunidades”, define Marina.
*Fonte: SC Inova | Foto: Soninha Vill